domingo, 24 de novembro de 2024

Vigiar e .... é ....Punir

 Vigiar ... e....é .... Punir


O ‘pingo’ no ‘e’ faz a diferença. O acento muda as ações e define sentimentos. Vigiar e Punir facilmente traz outra verdade: Vigiar é Punir. Desprovida de vigilância e/ou punição, fui para a apresentação teatral. Impossível não vigiar. Impossível não sentir o desejo de punir ......... mas quem??????? A quem?????
Me recolho à minha insignificância e ao questionamento primário... Cadê o público? A pergunta se dissipa quando são finalizados os três toques.  Agora não há espaço para pensar em quem não veio. É o momento de se abrir para a magia, de ficar pronta para receber ......Receber o quê? Não sei. Somente depois é que, às vezes, tenho essa resposta. Às vezes recebo mais perguntas. Mas perguntando ou respondendo, estou ali, vazia de respostas, vazia de perguntas e pronta ......
No palco a mensagem é clara e vai ao encontro do meu esvaziar.
“Existem outros meios de ver as coisas. Desliguem o cabeção de vocês para entender ...”
Tem gente que ainda não entendeu que o silêncio é um personagem fundamental, mas se não posso punir, nem vou vigiar.
Sinto a força do olhar da boneca Severina e, num deslize me vejo novamente vigiando. O desejo de punição me faz querer tirar o celular da mão da mulher sentada na primeira fila. Fico no desejo e tomo a melhor decisão da noite . Me esvazio do desejo, de mim e, assim, da necessidade de vigiar, da vontade de punir. Decisão irrevogável. Escapo da dança para a força e da morte da velha. Naquela magia, vazia, me sinto ser cheia, paradoxalmente, de mim mesma. Não consigo dissociar o homem do boneco. Um dando vida ao outro. Um vivificando e mortificando o outro.
Começo uma viagem interior por caminhos bem conhecidos e entrecortados por pequenas estações, pontos de parada e partida, lugares de escolhas, pontos de oportunidades de mudança, ou não. Uma briga do eu comigo mesma e com o mundo. Tal qual no palco, brigam, dentro de mim, o santo e o profano.
Ah!!!!!! Focaut. O que mudou? O poder? A disciplina? A punição? A obediência ou a subserviência?
Ou nada mudou?
Difícil não ser sujeito dócil nessa produção vigilante, diante de tantas palmatórias.
Por quem me tomas? Por onde vou?  Para onde vou? Como escapar?
Perguntas, perguntas e perguntas. Sinto que elas começam a transbordar, mas sinto também que ainda não sei respondê-las.
Vigiar e punir. Vigiar ou punir. Vigiar. Punir.
Vou para a escola, ainda que ela esteja distante da Educação? Vou?
O que difere o meu do seu tempo?
Sistema de controle. Regulamentos.
Aí !!!!! Senti na alma a dor da palmatória. A dor que nos faz dar a mão para o que nos resigna, que nos molda, nos taxa,  nos vigia e nos puni.
Enquanto eu ia me enchendo de mim mesma, agora numa viagem que não defini se social ou educacional, no palco “Vigiar e Punir” foi me levando para os tempos, os anos, as marcas, os controles, o normal, o anormal.
Estive em 1950, 1965, 1970, 1981. Estive em todos os tempos. No ontem e no hoje. Acho que passei pelo amanhã.
- Ritalina !! ?
- Presente.
- Pílula da inteligência!!?
- Presente.
- Consumo desenfreado!!?
- Presente.
Sou louca? Sou artista? Sou como aqueles que estão no palco?
Sou a sequela filosofada por Focaut?
Artista. Louco. Vagabundo. Todos somos defeitos colaterais.
Mas acho que, com ou sem defeito, vejo na “Santa” a tirania e me lembro do Auto da Compadecida. O que tem a ver? Tudo. Nada. Não sei.
Viagem maluca que me mostra o que já vivia, e me escancara a higienização social que, logicamente, não veio acompanhada de direito social.
Sentada, completamente envolvida, me libertando fui me vendo aprisionada e aprisionando. Vigiada e vigiando. Punida e punindo. Fui vendo os mecanismos de controle e de punição, embora já os conhecesse e soubesse da força de cada um.
A ‘peste’ foi além de suas mazelas. Foi segregação. Foi vigilância. Foi punição. Foi o ‘pingo’ no ‘e’. Foi o motivo perfeito para punir o pensante, o contrário, o ‘diferente’. Foi a onda que afundou o barco, onde, além de Jonas, ou de Jesus, estavam os comunistas, os vegetarianos, os estudantes de filosofia. Estavam os usuários da Ritalina e os que dela sentiam a abstinência .
Não estava no barco o homem capitalista neo liberal. Mas,  vamos seguir a viagem e, por mais que tente alçar novos voos me vejo aprisionada. Triste descobrir, ou redescobrir que  passarinho que nasce  engaiolado, que dorme engaiolado,  pensa que voar é doença.  
Lembrei-me de Vó Idalina, que partiu em 1989. A vi sentada, próximo ao girau, do lado do galinheiro, cortando as asas daquelas que ‘livres’ tentavam voar. Lembrei-me de Vó Idalina cortando as asas e brigando com as que ousavam tal ato. Era preciso disciplina e está, normaliza a violência. Você quer asas para quê?
O jeito foi seguir viagem entendendo que levo comigo o não saber, o remorso e a culpa. Levo a dor de saber e nada (PODER) fazer. Não mesmo?????
Saber a gente sabe mas, ..... se não é comigo..... Lembrei-me (quantas lembranças) de Todo Mundo, Alguém, Qualquer Um e Ninguém.
Aporto na estação da Família e parece que marquei encontro com  a Igreja, com a Escola e com a Disciplina. Mansamente digo sim, enquanto sufoco o grito do não. Não. Ele não pode ecoar. Na briga do sim com o não, ouço os sussurros de Cassandra. Será que estou louca, por pensar assim......

Confusão?
Foi assim, num misto frenético do tudo com o nada que assisti ao espetáculo Vigiar e Punir, apresentado na Sala Miguel Mônico (Garça) em 12 de setembro de 2024, pela Cia Caravan Maschera.  A escrita acima está confusa? Não sei se esse era o propósito, mas a Cia Caravan Maschera me fez trazer à tona questionamentos amortecidos. Questionamentos que acumulei na minha vida panóptica, onde a culpa e a inocência não se separam. Sou vítima e sou algoz. Com todas as letras, ou com todas as falas, a Cia Caravan Maschera, em Vigiar e Punir, desnudou a minha culpa, o meu ceticismo na família, a minha crença na medicina. Passei pelos séculos 17, 18, 19. Passei (?) pelos poderes de controle. Vi o nascimento de algumas prisões. Aprisionei. Libertei. Senti a impotência de Cassandra. Me calei. Amargurei. Pensei. Me enchi.
No palco os bonecos ganharam vida e, também, mostraram, não de forma leve, mas sem pesar, como os conceitos de punição e vigilância evoluíram.
O espetáculo trouxe a culpa, mas trouxe também poesia, emoção e, porque não dizer, humor. O espetáculo foi o cavalo de troia no combate a minha violência.
 Vigiar e Punir, mostrou a norma e o poder disciplinar.
E, não tão de repente, vigiar é punir.
Fiquei pronta para receber ......
As respostas??????  Não sei se me enchi delas.


OBS: Muito ainda há para se dizer ou escrever .... 






















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